A Arte de Soltar, Confiar e Deixar Ir
No último vídeo que gravei com a Joana Jacinto Ricardo, abordámos muito ao de leve um tema que toca a todos nós em algum momento da vida: o deixar ir.
Se ainda não passaste por esse processo, é quase certo que um dia vais passar. Seja uma relação, uma fase da vida, uma oportunidade, uma amizade, um sonho ou até mesmo uma versão antiga de nós próprios — há momentos em que somos chamados a soltar. A deixar ir, mesmo quando o coração pede que aquilo se eternize.
Mas o deixar ir não é fácil. E não é suposto ser.
Segundo o psiquiatra David R. Hawkins, o verdadeiro “deixar ir” não é um ato de fraqueza ou desistência. É um ato de coragem, de libertação emocional, e acima de tudo, de aceitação do fluxo natural da vida.
O que significa “Deixar Ir”?
Deixar ir é o processo de soltar o apego emocional às coisas, pessoas, circunstâncias ou resultados que desejamos controlar.
Segundo Hawkins, o que nos prende não é a situação em si, mas a energia emocional que carregamos em relação a ela — medo, tristeza, raiva, apego, carência. E enquanto não libertarmos essa carga emocional, continuamos presos, mesmo que a situação já tenha mudado externamente.
Ele diz:
“A única coisa que realmente nos prende é o desejo de controlar. Quando soltas esse desejo, abres espaço para que algo novo e melhor surja.”
O ciclo natural do desapego
Muitas vezes pensamos que “deixar ir” significa esquecer completamente ou nunca mais sentir. Mas não é bem assim.
Eu costumo dizer que quando sentimos paz e alívio, mesmo com alguma saudade ou nostalgia, é sinal de que estamos no caminho certo. Isso não quer dizer que não vais lembrar-te de momentos, de pessoas, de fases bonitas da tua vida (não estou a falar de amnésia ) . Essas memórias fazem parte da tua história. Podem até surgir gatilhos no cérebro — uma música, um lugar, um cheiro — que trazem à tona sentimentos antigos.
E está tudo bem com isso.
O importante é que essas lembranças já não te prendam. Que elas venham sem te arrastar para um estado de sofrimento ou de resistência ao momento presente.
O método de David R. Hawkins: o “Letting Go Technique”
Hawkins propõe um método simples (mas poderoso) para deixar ir:
- Reconhece o sentimento – Não o sufoques, não o racionalizes. Apenas sente.
- Permite-te sentir sem resistir – Deixa o sentimento existir sem julgar ou tentar mudar.
- Evita identificar-te com o sentimento – Tu não és o medo, a tristeza ou a raiva. Estás apenas a senti-los.
- Observa-o até que ele se dissolva – Quando paramos de resistir, o sentimento perde força e, eventualmente, desaparece.
Este processo pode ser feito em silêncio, na meditação, num momento a sós, ou até no meio do caos do dia a dia. A chave está em não lutar contra o que sentes.
E se voltar?
Sim, pode acontecer: aquela pessoa, aquela oportunidade, aquele sonho pode voltar mais tarde. Mas aí, algo mudou — tu já não és a mesma pessoa. A aprendizagem já foi feita. Já não há o mesmo apego, nem a mesma necessidade.
E se não voltar? Tudo bem também. Outras pessoas, momentos e possibilidades virão.
Muitas vezes, as oportunidades vêm disfarçadas de perdas. E só mais tarde percebemos que aquele momento de “fim” foi, na verdade, a porta de entrada para algo novo.
Conclusão: Soltar é confiar
Deixar ir é um processo contínuo, e não uma decisão de um dia para o outro. Exige presença, humildade e entrega.
É como disse Hawkins:
“Deixar ir é libertar-se da ilusão de que podemos controlar tudo. E, paradoxalmente, é nesse momento que começamos a experimentar verdadeira liberdade.”
Se estás num momento de transição, ou se sentes que estás a ser chamado a deixar algo ir, honra esse processo.
Escuta o teu corpo, acolhe as tuas emoções, e lembra-te: o que é teu encontra sempre forma de ficar. E o que precisa ir, abre espaço para o que realmente importa.

